Pandas não estão em extinção. Duvida? É só entrar na loja de sneakers mais próxima.
A Nike está a caminho de fechar o seu pior ano em receita nos últimos 25 anos, de acordo com Daniel-Yaw Miller da Business of Fashion, ameaçada pelo crescimento de marcas como On e Hoka em tênis de performance e New Balance e Adidas no segmento casual/sneakers. A trajetória recente dos Panda Dunks servem como um microcosmos útil dos erros da Nike que levaram a esse desempenho.
O Panda Dunk Low, nome da versão p&b de um dos modelos mais clássicos da Nike, foi lançado oficialmente na pandemia e se aproveitou do boom de consumo pandêmico (ou imediatamente pós-pandêmico), se tornando o sneaker mais procurado dos anos de 2022 e 2023 globalmente. Os “drops” (abastecimentos limitados) do modelo eram tímidos no início, levando esse tênis curiosamente básico para um sneaker a preços de revenda insanos.
Ao invés de manter o status de “baleia branca” dos Panda Dunks, mantendo a escassez do modelo no mercado de venda direta, a Nike começou a fazer mais Pandas. E mais Pandas. E mais Pandas. De repente Panda Dunks se tornaram apenas mais um modelo de tênis, copiado ad infinitum por marcas casuais, precificado muito acima dos seus benefícios e tão constante na paisagem urbana que grande parte dos apaixonados por sneakers e moda torcem imediatamente o nariz ao ver um par nos pés de alguém.
Sabia o que também se aproveitou da combinação de demanda reprimida e tédio do pós-pandemia para estrear com um estouro, e não soube lidar com controle de demanda?
O Primavera Sound Brasil.
Ou você esteve no Primavera Sound Brasil 2022, estreia do festival catalão em São Paulo, ou você vive sob a sombra da sua ausência nesse festival desde então. A primeira edição do Primavera Sound Brasil trouxe pro mercado de festivais brasileiros a combinação perfeita de lineup coeso, focado, estrutura (localização, banheiros e alimentação), preço e puro timing, e o público respondeu a altura, com uma quantidade absurda de publicidade gratuita. Todo mundo que foi ao festival o divulgou à exaustão sem o menor custo para os organizadores, e isso se traduziu em uma demanda enorme pela edição 2023.
”Ah então eles amaram esse festival por seu lineup de nicho e estrutura de médio porte com uma escala que nos permitiu oferecer boa localização e serviços de qualidade. Agora todo mundo quer ir nesse festival? E se ampliarmos o festival para comportar toda essa demanda, mudando assim absolutamente todos os fatores que foram importantes para o sucesso da primeira edição?”
O Primavera Sound foi pro Autódromo de Interlagos, diversificou o lineup, ampliou a capacidade e com isso todo mundo podia ir ao festival - e ninguém mais queria.
Nessa semana o Primavera Sound Brasil anunciou o cancelamento de sua edição 2024.
Perceber demanda não significa, necessariamente, buscar uma maneira de suprir essa demanda. Algumas coisas são atraentes exatamente pelo seu caráter exclusivo, limitado, e bons profissionais são capazes de mapear o que leva ao desejo do consumidor por algo, além de serem frios o suficiente para ver a oportunidade de escalar produção e não embarcar se isso significar perder os pontos fortes do produto.
A indústria da cerveja artesanal aprendeu essa lição de maneira dura nos últimos anos, com o boom da categoria sendo resfriado pelo crescimento desenfreado da produção.
Um it sneaker pode virar apenas um tênis caro em toda prateleira, um Primavera pode apenas se tornar um Lollapalooza com outro nome, uma craft lager apenas a mais nova puro malte de uma prateleira lotada.
"Ou você esteve no Primavera Sound Brasil 2022, estreia do festival catalão em São Paulo, ou você vive sob a sombra da sua ausência nesse festival desde então" fato! e mesmo estando entre as pessoas que foram em 2022, ainda vivo sobre sua sombra, triste que não teremos mais nada como ele
Excelente amarração! :)